ATA DA VIGÉSIMA OITAVA SESSÃO ORDINÁRIA DA TERCEIRA
SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA QUINTA LEGISLATURA, EM 07-4-2011.
Aos sete dias do mês de abril do ano de dois mil e
onze, reuniu-se, no Plenário Otávio Rocha do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal
de Porto Alegre. Às quatorze horas e quinze minutos, foi realizada a segunda
chamada, respondida pelos vereadores Airto Ferronato, Bernardino Vendruscolo,
Carlos Todeschini, Dr. Raul Torelly, Elói Guimarães, Fernanda Melchionna, João
Antonio Dib, Maria Celeste, Mario Fraga, Mauro Pinheiro, Nilo Santos, Paulinho
Rubem Berta, Professor Garcia, Sofia Cavedon, Tarciso Flecha Negra e Toni
Proença. Constatada
a existência de quórum, a senhora Presidenta declarou abertos os trabalhos.
Ainda, durante a Sessão, compareceram os vereadores Alceu Brasinha, Aldacir
José Oliboni, Dr. Thiago Duarte, Elias Vidal, Engenheiro Comassetto, Haroldo de
Souza, Idenir Cecchim, João Carlos Nedel, Luciano Marcantônio, Marcello Chiodo,
Mario Manfro, Mauro Zacher, Nelcir Tessaro, Pedro Ruas, Sebastião Melo e Waldir
Canal. À MESA, foi encaminhado, pelo vereador Aldacir José Oliboni, o Projeto de Lei
do Legislativo nº 015/11 (Processo nº 0694/11). Do EXPEDIENTE, constaram os
Comunicados nos 290854, 290855, 290856, 290857, 290858, 290859,
290860, 290861, 290862, 290863, 290864, 290865 e 290866/11, do senhor Daniel
Silva Balaban, Presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação –
FNDE. Após, foi apregoado o Memorando nº 011/11, de autoria do vereador Aldacir José
Oliboni, deferido pela senhora Presidenta, solicitando autorização para representar externamente
este Legislativo, no dia de hoje, em
solenidade relativa à visita do senhor Fernando Haddad, Ministro da Educação,
ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, às
dezesseis horas e trinta minutos, no Município de Canoas – RS. Em
prosseguimento, por solicitação da vereadora Sofia Cavedon, foi realizado um
minuto de silêncio em homenagem póstuma às crianças mortas no dia de hoje na
Escola Municipal Tasso da Silveira, do Município do Rio de Janeiro – RJ. A
seguir, a senhora Presidenta informou que o Conselho Municipal do Idoso não
faria uso da Tribuna Popular agendada para a presente Sessão. Em
continuidade, foi iniciado o período de COMUNICAÇÕES, hoje destinado, nos
termos do artigo 180, § 4º, do Regimento, a tratar do tema “Direito à cidade,
direito de todos”. Compuseram a Mesa a vereadora Sofia Cavedon e o vereador
Toni Proença, respectivamente Presidenta e Vice-Presidente da Câmara Municipal
de Porto Alegre, e as senhoras Vanêsca Buzelato Prestes e Débora
Balzan Fleck,
respectivamente Diretora da Fundação Escola Superior de Direito
Municipal – ESDM – e Diretora da Escola do Legislativo Julieta Battistioli. Após, a senhora Presidenta
concedeu a palavra, nos termos do artigo 180, § 4º, inciso I, à senhora Vanêsca
Buzelato Prestes, que se pronunciou sobre o tema em debate. Durante o
pronunciamento da senhora Vanêsca Buzelato Prestes, foi realizada apresentação
de audiovisual referente ao tema abordado por Sua Senhoria. Em COMUNICAÇÕES,
nos termos do artigo 180, § 4º, inciso III, do Regimento, pronunciaram-se os
vereadores Engenheiro Comassetto, João Antonio Dib, Carlos Todeschini, Elói
Guimarães, Pedro Ruas, Dr. Thiago Duarte e Dr. Raul Torelly. Em COMUNICAÇÃO DE
LÍDER, pronunciou-se o vereador Airto Ferronato. A seguir, o senhor Presidente
concedeu a palavra, para considerações finais sobre o tema em debate, à senhora
senhora Vanêsca Buzelato Prestes. Às dezesseis horas e oito minutos, os trabalhos
foram regimentalmente suspensos, sendo retomados às dezesseis horas e nove
minutos, constatada a existência de quórum. Após, constatada a existência de
quórum deliberativo, foi aprovado Requerimento verbal formulado pelo vereador
Toni Proença, solicitando alteração na ordem dos trabalhos da presente Sessão.
Em COMUNICAÇÃO DE LÍDER, pronunciaram-se os vereadores João Antonio Dib e
Carlos Todeschini, este pela oposição. Em PAUTA, Discussão Preliminar,
estiveram: em 1ª Sessão, os Projetos de Lei do Legislativo nos 022 e
033/11; em 2ª Sessão, os Projetos de Lei do Legislativo nos 018, 028
e 030/11. Durante os trabalhos, foi registrada a presença, neste Plenário, do
vereador Paulo Renato Mattos Gomes, Presidente da Câmara
Municipal de Rio Grande – RS. Às dezesseis horas e vinte e três minutos,
constatada a inexistência de quórum, em verificação solicitada pelo vereador
Haroldo de Souza, o senhor Presidente declarou encerrados os trabalhos,
convocando os senhores vereadores para a Sessão Ordinária da próxima segunda-feira,
à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pela vereadora Sofia Cavedon e
pelo vereador Toni Proença e secretariados pelo vereador Toni Proença. Do que
foi lavrada a presente Ata, que, após distribuída e aprovada, será assinada
pelo senhor 1º Secretário e pela senhora Presidenta.
A SRA.
PRESIDENTE (Sofia Cavedon): Nós hoje estamos vivendo um momento de comoção no
Brasil, de comoção para a Educação, um momento de indignação com o assassinato
de onze crianças numa escola do Rio do Janeiro. A nossa incompreensão e a
inconformidade com tamanha brutalidade foram manifestadas pela Presidente
Dilma, que declarou luto oficial por três dias. O acontecido traz-nos uma
preocupação sobremaneira com as nossas escolas quanto à segurança e com a enorme
responsabilidade que tem a Direção de uma escola e os professores, com tão
poucas condições para receber os alunos com segurança, às vezes sem guarda, sem
portaria, para poder fazer uma revista, uma triagem. A brutalidade vivida hoje
expõe um país ainda profundamente violento, um país que não consegue proteger a
sua infância; expõe a fragilidade das escolas brasileiras e deixa-nos muito
conscientes, cientes, ciosos de que onde nós trabalhos com mil, com quinhentos,
com quatrocentos, com três mil alunos nós não podemos não ter todas as
condições para garantir a segurança e a qualidade do atendimento a essas
crianças. O Brasil está vivendo um momento especial de desenvolvimento, mas não
pode esquecer que é um país que tem uma cultura de violência, tem uma brutal
herança em função da desigualdade, da pobreza, do uso da arma, do uso da
violência, do crime, e nós ainda estamos com as nossas crianças submetidas a
isso.
O Ministro Fernando Haddad, hoje pela manhã, aqui
no Rio Grande do Sul, assinando um convênio com o Governo do Estado para a
formação de professores, exatamente para a qualificação das nossas escolas,
registrou, em um minuto de silêncio, a indignação e a comoção da Educação
brasileira. E eu solicito - o Ver. Idenir Cecchim ia solicitar - um minuto silêncio
e agradeço ao Vereador por me permitir fazer essa solicitação, porque é um dia
muito triste para a Educação, muito triste para todos os brasileiros, mas para
a Educação especialmente. Então, eu solicito que façamos um minuto de silêncio.
(Faz-se
um minuto de silêncio.)
A SRA. PRESIDENTE (Sofia Cavedon): Conforme
agenda, teríamos a Tribuna Popular, que ficou transferida. Receberíamos o Comui
- Conselho Municipal do Idoso -, que falaria sobre a III Conferência Municipal
do Idoso.
Passamos às
Hoje este período
destina-se a tratar do tema “Direito à Cidade, Direito de Todos”. Nós estamos
iniciando abril, e a ideia é de que a Câmara se debruce mais sobre o tema do
direito à Cidade. Nós teremos três grandes Audiências Públicas em abril: uma
acontecerá hoje à noite, será sobre a circulação de bicicletas na Cidade; na
quinta-feira próxima, sobre o Código Florestal Brasileiro, as mudanças do
Código que implicam em Porto Alegre e implicam no nosso planeta e, na última
quinta-feira do mês, dia 28, haverá uma grande Audiência Pública sobre o Plano
Diretor de Acessibilidade, que também trata do direito à Cidade. Estamos
começando a planejar a Semana do Meio Ambiente, que será em junho; portanto,
nestes três meses, vamos trabalhar com os temas que envolvem o direito à
Cidade.
Consideramos muito
oportuna a visita da Drª Vanêsca Buzelato Prestes, Diretora da Escola Superior
de Direito Municipal, que nos trouxe um convite para a participação num curso
que está promovendo a Escola Superior. Fizemos o convite à Drª Vanêsca,
doutorada nessa área da legislação dos direitos que normatizam a organização da
cidade; então, é com ela que nós contamos nesta tarde. Nós, Vereadores e
Vereadoras, tratamos muitas vezes de diferentes aspectos desse tema.
Convidamos para
compor a Mesa a Drª Vanêsca Buzelato Prestes e a nossa Diretora da Escola do
Legislativo, a Débora Balzan Fleck, que trabalhou na divulgação e na
organização desta participação.
A Srª Vanêsca Buzelato Prestes, Diretora da Escola Superior de Direito Municipal, está com a
palavra.
A SRA. VANÊSCA
BUZELATO PRESTES: Boa-tarde a todos. Em primeiro lugar, eu queria
agradecer imensamente o convite da Verª Sofia, Presidente desta Casa. Na
verdade, há dez dias estive aqui entregando um convite para o curso de Especialização
em Direito Municipal, que trata exatamente desses temas relacionados ao
cotidiano dos senhores, e acabamos combinando este momento, para abordar o tema
“Direito à Cidade, Cidade de Todos”. Evidentemente - ao saudá-los, eu queria
salientar isto -, o que eu vou colocar aos senhores está dentro do âmbito
jurídico, que é o âmbito com o qual eu posso trabalhar. Vejo aqui pessoas que
conheço já há muito tempo nessa trajetória toda, pessoas que têm um enorme
acúmulo para falar das questões da Cidade. Então, a espécie de contribuição que
posso dar aqui, neste momento, é no sentido de trabalhar a dimensão do conteúdo
jurídico da Cidade que estamos tratando hoje.
Para falar disso, precisamos pensar um pouquinho se
existe diferença entre as cidades que vivenciamos e o nosso momento atual, para
chegar ao desafio jurídico que temos na denominada contemporaneidade, que é o
momento atual. Fica claro, quando a gente se debruça sobre um método para
estudar essas questões, que as cidades foram se modificando ao longo do tempo e
que essa modificação decorre do conceito histórico do momento.
(Procede-se à apresentação em PowerPoint.)
A SRA. VANÊSCA
BUZELATO PRESTES: Aqui eu apresento uma rápida digressão histórica,
cujo objetivo não é dar uma aula, enfim, mas só situar sobre o que estamos
trabalhando. Temos, na história da humanidade, várias formas de comportamento
das cidades. Nas cidades antigas, tínhamos algo como uma associação de tribos.
As tribos determinavam o comportamento dos cidadãos. Não era possível casar
entre tribos distintas. A moeda era o escambo, funcionava dentro da própria
tribo. Então, naquele momento histórico, não podia se falar, por exemplo, em
direitos dos cidadãos, não havia cidadãos.
No período medieval, as cidades tiveram uma intensa
modificação, porque os reis foram morar em determinados locais. A Europa
representa muito isso. Com o fato de receber os reinados, tivemos todo um
embelezamento das cidades, toda a grandiosidade das obras, que foram
preservadas, toda uma característica muito forte das cidades. Nesse período do
medievo, as cidades eram denominadas cidades-estado. Elas tinham uma força
política e econômica muito significativa - tínhamos Constantinopla, Veneza -,
quer dizer, eram focos da política econômica, nós não tínhamos o conceito de
cidade-nação. As cidades que recebiam os reis do período tinham toda uma
caracterização relevantíssima, que dava, senão o conceito jurídico, as regras -
hoje o conceito jurídico é mais amplo - de convivência desse próprio período.
Os filmes demonstram isso.
Entre os séculos XV e XVIII, tivemos a introdução
do modelo capitalismo mercantilista. Então, a questão de propriedade toma um
outro relevo, há uma extensão dos limites das cidades - temos aqui Vereadores
urbanistas que trabalham esse conteúdo em outras áreas, em outros âmbitos -,
percebe-se que há uma perda do controle daquelas regras nesse período. Nós
temos, no período pós-medieval, aumento de recursos... Quer dizer, uma série de
questões que vão substituindo e vão mudando os modelos de cidade, porque também
modifica a própria economia.
No período do pós-medievo, que é o período
denominado liberal, há o que os urbanistas chamam de perda do controle das
regras da cidade. À medida que as cidades saem dos muros, ao mesmo tempo em que
isso se dá de uma forma positiva por alguns aspectos, no aspecto urbanístico e
do controle da terra, perde-se a possibilidade de dizer onde podem e onde não
podem determinados comportamentos, o que era uma característica das regras
dentro das próprias cidades. Nesse período, é apontado que as funções urbanas
deixam de ser significativas, que é o que vai tentar ser recuperado no período
posterior, que é o início da modernidade.
Na modernidade, o que
acontece? É claro que a modernidade não se dá ao mesmo tempo em todo o espaço,
em todo lugar, mas aqui o que é caracterizado por modernidade é o período: nós
começamos a vivenciar o aço, o telefone, a energia - toda essa revolução de
costumes que vai fazer com que o espaço urbano seja um espaço prestigiado
dentro do universo. Inicia o êxodo rural. As pessoas vêm para o espaço urbano
em busca dos confortos que a modernidade nos trouxe, e hoje nós estamos
trabalhando em como resolver os problemas decorrentes da modernidade. Como
característica nas cidades, nós tivemos a funcionalização, a tentativa de
resgate de regras, os planos. No Brasil, nós temos as cidades planejadas:
Brasília, Goiânia... Tivemos, também, todos os problemas decorrentes deste
planejamento, que não englobou todo mundo. E esse é um dos aspectos que a gente
tem que ter claro, e é por isso que hoje se discute cidade para todos, porque o
planejamento da modernidade não previu todos os espaços, ou previu espaços
insuficientes para as necessidades que nós temos. A nossa maior cidade
planejada - Brasília - não previu os espaços em que os construtores de Brasília
iam residir. Quando nós discutimos aqui em Porto Alegre todos os problemas
decorrentes dos processos de falta de habitação e tal, temos, também, que
perceber que isso decorre de um modelo que foi adotado ao longo de muito tempo
no nosso País e que refletia o próprio modelo de planejamento desse período.
Temos aqui os
princípios arquitetônicos - não vou cansá-los em explorar este conteúdo -, mas,
certamente, os senhores, examinando isso, vão dar-se conta muito do que
inspirou os nossos Planos Diretores - os Planos Diretores físicos,
territoriais, colocando a questão, por exemplo, do domínio da paisagem sobre a
cidade construída. O verde passa a constituir um espaço importante, mesmo que
esses verdes tenham sido feitos em cima de aterros. Nas grandes cidades
brasileiras, a incorporação de espaços de vias públicas e os grandes parques se
dão com aterros no mar, com aterros nos cursos d’água, inclusive aqui em Porto
Alegre, o espaço em que estamos.
Então, este é um dos
legados da modernidade; não é crítica, é constatação, porque, naquele período,
nós não tínhamos o que hoje nós estamos enfrentando com relação
aos aspectos decorrentes do aquecimento global, das preocupações da
contemporaneidade com escassez de recursos naturais, que permeiam o nosso
cotidiano, como as tempestades, que estão voltando, enfim, a pauta era
distinta, e a técnica dominava todo um conteúdo. Também é desse período a
cidade industrial, os modelos de planejamento, a cidade-jardim, que é um modelo
de planejamento também desse período da modernidade, refletido hoje pelos
condomínios fechados. Enfim, é uma série de modelos que refletem esse tipo de
conteúdo.
Uma das características da modernidade que eu
gostaria de enfatizar aqui foi o estabelecimento dessa diferença entre o urbano
e o rural: a cidade ser urbano, o moderno ser o urbano, o arcaico ser o rural.
Até então cidade era dimensão do território - na rapidíssima digressão
histórica que nós fizemos aqui, a gente se dá conta disso -, nós tínhamos
cidades com dimensão de território: as cidades-estados, as cidades do medievo,
as tribos no início; nós viemos no histórico da humanidade com essa
característica. No período da modernidade, em função de o processo de
planejamento ficar restrito a uma parte do território, nós acabamos adotando o
conceito de cidade vinculado à área urbana. Isso nos causou uma série de
problemas, dentre os quais não planejar o território todo.
Eu sou Procuradora há vinte anos neste Município,
não diretamente aqui em Porto Alegre, mas auxiliando Prefeitos do Interior, por
exemplo, num determinado período em que tiveram, nas suas contas, um
apontamento do Tribunal de Contas de que não poderiam gastar recursos na área
rural, porque o recurso do Município era oriundo do IPTU, enfim, desse tipo de
recurso. Por outro lado, acompanhei vários momentos de necessidades, de
tentativas de transformar em área urbana, independente da vocação, do
território, para ter serviços públicos. Então essa dicotomia é uma das questões
que hoje nós estamos recuperando com a Constituição de 1988 e com o Estatuto da
Cidade, que voltaram a tratar as cidades na dimensão de território. Nesse
particular, o nosso Plano Diretor - o Plano Diretor de 2000, antes do Estatuto
da Cidade, que deixou isso de forma expressa - já tratava a dimensão de
território, justamente porque hoje,
para falar de sustentabilidade das cidades, não é mais possível trabalhar só o
espaço urbano. E os senhores, ao longo da trajetória desta Casa, dão conta
disso, à medida que trazem uma série de leis que trabalham essa dimensão de
território.
Então, essa funcionalização ficou caracterizada com o período da
modernidade por uma série de situações, dentre as quais, as destacadas aqui.
Mas os urbanistas europeus - que é onde começa tudo isso -, já no final do
Século XIV, apontavam o enorme problema trazido por essa espécie de segregação,
o que nós conseguimos recuperar só no início do Século XXI, com a introdução
dessa legislação.
Então, o que nós podemos dizer que é a nossa Cidade na contemporaneidade?
O que é essa contemporaneidade? Contemporaneidade - o momento que estamos
vivendo - é, do ponto de vista jurídico, um espaço que tem e que se pauta por
uma Constituição. E a constituição de um Estado Democrático... A Constituição
Brasileira integra o ciclo das constituições democráticas do pós-guerra. As
constituições democráticas do pós-guerra têm como característica apontar
direitos fundamentais, e esses direitos fundamentais são direitos que têm, na
sua essência: primeiro, a possibilidade de judicialização dos seus resultados;
segundo, a existência de cláusulas contramajoritárias para proteger esse núcleo
de direitos que estão aí colocados. E a Cidade está dentro desse conteúdo.
Nós temos, dentro da nossa Constituição, um capítulo específico da
Política Urbana - artigos 182 e 183, combinado com o direito à moradia, como o
meio ambiente; do Direito Social, art. 6º; do Meio Ambiente equilibrado, art.º
225, que não se restringe ao ambiente natural, mas à dimensão de todo o
ecossistema, inclusive com a presença do homem, e mais a questão da gestão
democrática, que se dá muito no âmbito concretizado do espaço da cidade. Então,
esses quatro eixos estruturantes dão conta hoje do conteúdo do que nós
denominamos direito fundamental à cidade. E isso parece muito teórico, mas ele
se reflete nos processos de aprovação do Município, nas ações judiciais que nós
vamos defender na Procuradoria, nos projetos de lei que os senhores trabalham. Por exemplo, essas cláusulas contramajoritárias, de defesa da Cidade
como expressão do direito à diferença, vão aparecer, por exemplo, nas normas de
acessibilidade. Por que se faz isso? Porque, se a cidade do Estado Democrático
de Direito é uma cidade que tem que ser inclusiva, uma cidade plural, ela tem
que proteger de algum modo, com algum regramento as diferenças para
possibilitar a inclusão. É nessa linha que vêm todas essas leis, e aqui os
senhores têm feito um enorme debate, que depois cabe a nós, do Executivo,
aplicarmos e, na Procuradoria, sustentarmos. Não raro nós nos deparamos com
esses conceitos, quando vamos discutir, por exemplo - e foi muito forte uma
parceria importante aqui com esta Casa -, com relação às cotas nos editais de
concurso público; tem a mesma característica. Então, por que hoje se faz isso?
Em função da característica do tipo de cidade que nós temos.
Além disso, nós temos
lá a cidade como espaço de cidadania. Se há um espaço de cidadania, também
precisamos ter esses espaços plurais, que não são só físicos; são espaços de
expressão desse conteúdo de cidadania. Sempre brinco, cheguei a usar a alegoria
de um filme francês - Chocolate -, em que o Prefeito não permitia que
forasteiros chegassem à cidade, porque ele gostava de manter o completo
controle da sua cidade. O filme é com a Juliette Binoche, é um filme que tem
várias decorrências, poderia ter várias análises. Agora, do ponto de vista
jurídico, o que a gente tem que pensar é: será que esse tipo de postura que
existia lá é possível? Claro que esse exemplo é absurdo, e todos nós
responderíamos que não. Mas até bem pouco tempo nós tínhamos Prefeitos próximos
aqui que devolviam as pessoas à sua cidade de origem. Será que é possível? É um
debate que precisamos fazer dentro desse contexto do Estado Democrático de
Direito; a cidade é um dos elementos que compõem o Estado Democrático de
Direito.
Sobre a função
socioambiental: eu colocava aqui aos senhores que muito das cidades se
desenvolveram, foram construídas, que os Planos Diretores foram desenhados, a exemplo do Plano Diretor Pereira Passos, do Rio de
Janeiro, um dos exemplos bem significativos que temos; foi um dos primeiros,
relevantíssimo. Mas, hoje, será que os Planos Diretores seriam feitos dessa
forma? Por quê? Porque a questão dos aterros, da quantidade de aterros que
foram feitos, produziu uma série de conteúdos que hoje estamos enfrentando em
função dos efeitos do aquecimento global: o mar subindo, o regime das
edificações completamente alto, não tem insolação, tendo que mudar a areia na
beira da praia. Há locais, no Brasil, em que o banho de mar não é mais possível
devido à presença de tubarões, acabando com o polo turístico, “matando a
galinha dos ovos de ouro”, como dizem na minha terra - na Serra, nós usamos
muito essa terminologia. E aqui eu poderia falar do Nordeste, mas nós temos situações
muito próximas nossa. Aquela ideia de fragmentação, de cada um trabalhar no seu
universo, gerou um pouco dessas distorções.
Para além disso, nós
temos esse conteúdo de funções sociais da cidade, que não são só aquelas
funções da modernidade. Na modernidade, nós tínhamos a função recrear, a função
trabalhar, a função circular e a função morar - quatro funções importantíssimas
para recuperar aquele tempo perdido de controle e voltar ao embelezamento das
cidades, porque, no período liberal, houve um momento de perda. Agora, para
além dessas quatro funções, como é que nós vamos trabalhar hoje com cidades que
não têm esse viés ambiental? Como é que nós vamos trabalhar com o conceito de
função da Cidade sem discutir saneamento, infraestrutura, educação, entre
outros tantos?
O art. 2º, inc. I, do
Estatuto da Cidade dá-nos um conceito de cidade sustentável que amplia
bastante. Mas, para além disso, as necessidades e todas as questões colocadas
na Constituição fazem com que nós tenhamos uma cidade com múltiplas
necessidades. E aquele planejamento físico-territorial de até então passa a ser
substituído por um planejamento de gestão, que é o que os Planos Diretores,
hoje, cada vez mais refletem. E, para isso, temos essa ideia de dimensão de
território. A cidade não é área urbana, não é área de expansão urbana; a cidade
é todo o território, sendo que, cada vez mais, estão sendo desenvolvidos
instrumentos para fazer essa articulação urbano-rural, que possibilite
trabalhar o conceito de sustentabilidade na sua integralidade.
Então, a Constituição de 1988, que criou todas
essas possibilidades que as cidades exigiam - cidades plurais, democráticas,
com o cidadão no centro -, fez com que atividades como a que eu exerço, como
Procuradora de um Município do porte da nossa Cidade, tivessem que ser
revisadas e revisitadas, porque questões que nós tínhamos claras, por exemplo,
ajuizar uma ação demolitória sem perguntar a origem, sem ver se existe algum
núcleo de direitos daquelas pessoas, hoje já não é mais possível, porque há um
núcleo de direitos protegidos, o que faz com que uma série de questões sejam
revisitadas. Então, essa cidade, que engloba todo o território, foi
densificada, que é a linguagem que a gente usa no Direito. Ela está prevista lá
na Constituição, foi densificada no Estatuto da Cidade e concretizada no âmbito
dos Planos Diretores e dos projetos em espécie. E o Plano Diretor vai
estabelecer a função socioambiental desse conteúdo de território, tendo sempre
presente que o Estatuto da Cidade não é um estatuto que rege o ambiente
construído, mas que trabalha o conteúdo do território. O ambiente construído é
um dos elementos aí colocados.
A cidade no Estado Socioambiental: o que é essa
cidade no Estado Socioambiental? Nós temos vários autores que trabalham esse conteúdo
no Direito - não vou cansá-los -; agora, a ideia de Estado Socioambiental está
calcada na ideia de Estado Constitucional Ecológico, que traz a ideia de
justiça intergeracional e de direitos das futuras gerações. Isso nasce com as
Constituições dos Estados Democráticos. A questão dos direitos das futuras
gerações tem o mesmo patamar do direito à paz, do direito à liberdade de
expressão, porque todo o legado do pós 2ª Guerra faz com que a humanidade tenha
que repensar os seus fundamentos, em função de todas as agruras do nazismo. E
quebrando a fragmentação, porque, se nós fôssemos pensar objetivamente do ponto
de vista da preservação do patrimônio cultural, por exemplo, o nazismo foi um
protetor do patrimônio cultural. Mas a ideia é justamente não trabalhar a
fragmentação, porque a ideia intergeracional tem que trabalhar o seu contexto. O reflexo disso na Cidade vai ser, por exemplo, as medidas
compensatórias que temos; a ideia das construções objetivamente consideradas -
ter que prever a absorção de água em seu território -, enfim, é uma série de
questões que os senhores aprovam aqui, justamente porque têm que trabalhar o
presente para termos um futuro.
O outro ponto é a
questão do “eu/nós contra o Estado” substituída pelo “nós em favor do planeta”.
O Estado não é o único. Nós temos agora aquela questão da eficácia horizontal
dos direitos fundamentais; os cidadãos entre si também reclamam a questão
ambiental, os cidadãos entre si também aportam elementos. Esses dias eu
conversava com alguns colegas, e um colega disse que o condomínio dele fez uma
reclamação para um jornal X, que tem as suas atividades e trabalha próximo ao
condomínio, ao lado, e que já estava instalado lá há anos, estabelecido há
muito tempo; tem alvará, tem todas as condições, sempre esteve lá; e o jornal
fez a proteção acústica dos apartamentos que estavam sofrendo com o ruído. Isso
não é benevolência do jornal, que exerce uma atividade econômica; isso é
eficácia horizontal dos direitos fundamentais, porque a questão ambiental, e
não é só o ambiente natural, permeia tudo isso. Inclusive para evitar litígio,
há uma composição, e nós poderíamos ver muitos outros exemplos nesse sentido.
A outra questão é a
superação da dicotomia público/privado, e confesso aos senhores que isso é uma
questão pela qual, na Procuradoria, há muitos anos, se tem lutado, enfatizado.
O que é essa superação da dicotomia público/privado? Também o Poder Público,
quando vai construir a Cidade, tem que respeitar regras. Eu não estou falando
só do Poder Público municipal, mas dos Tribunais, que não preveem vias
estruturadoras, falo da falta de estacionamento, da necessidade de resolver
essas questões na sua essência, porque, historicamente, cada Poder Público
construía os seus prédios. Não tinha essa afirmação da competência do Município
em seu licenciador. À medida que outras matérias surgem, como a necessidade de
proteção de incêndio, acessibilidade, alguém tem que exercer essa atribuição de
licenciar, e é o Município. E é uma luta com ações judiciais. Agora, passado um
tempo, já está bastante afirmado, mas é uma necessidade muito importante, porque os
efeitos, na população, da falta do cumprimento dessas regras se dão de uma
forma muito concreta, e os cidadãos mesmos é que são os prejudicados.
E essa expressão socioambiental é a convergência
das agendas social e ambiental, fazendo essa aproximação. Por muito tempo e
muitas vezes isto ainda acontece, parece que o ambiente está aqui e as pessoas
lá, de forma diametralmente opostas. Mas, na verdade, essa aproximação, esse Estado
Socioambiental aproxima, ele enxerga a sua universalidade, tendo várias
decorrências para isso. Bom, então, esse Estado Socioambiental é a afirmação de
uma constituição de Estado Social que reconhece direitos fundamentais e fornece
os meios juridicionais para a sua consecução. O que significa isso? Muitas
vezes, os senhores nos chamam aqui ou ficam perplexos em função das ações
judiciais que, cada vez mais, têm surgido, questionando aprovações do
Município, licenciamentos, obras. Isso é reflexo do Estado Socioambiental e
Democrático de Direito, faz parte desse espaço de democracia. E, cada vez mais,
nós temos claro que a nossa grande função é ter motivado atos administrativos,
esclarecidos quais são os pontos, qual foi o processo de tomada de decisão, porque
muitas vezes nós temos colisão de direitos dentro de um mesmo processo de
aprovação. E há critérios jurídicos para chegar a um processo de tomada de
decisão; só que esses critérios jurídicos têm que ficar expressos, claros,
motivados, escritos e, sobretudo, publicizados nos respectivos processos de
aprovação, para poderem ser sustentados posteriormente.
Então, esse direito à Cidade, na sua dimensão
jurídica, é a abordagem socioambiental representando a fusão da denominada
Agenda Verde - Agenda 21, que se inicia com a Eco 92, da qual o Brasil foi
signatário, que implicou uma série de alterações na legislação
infraconstitucional, inclusive nas legislações municipais - e a denominada
Agenda Marrom, que é a Agenda Habitat, que começa com Istambul, em 1996; na
mesma forma do Tratado Internacional Ambiental, temos o Tratado Urbanístico,
que é o tratado do direito à moradia; são agendas que se aproximam muito,
porque a questão da falta de infraestrutura, da escassez de áreas verdes, da
necessidade de saneamento, da segurança das cidades aparecem em ambos os
documentos internacionais, dos quais o Brasil é signatário.
Essa cidade no espaço socioambiental tem
compromissos, e compromissos que não são só políticos. Aqui os senhores
poderiam me dar aula dos compromissos políticos, mas nesses resultados nós
temos decorrências e compromissos jurídicos, que é a denominada práxis
constitucional, que vai trazer, no seu fio condutor, a dignidade da pessoa
humana. Então, aqui também muda muito dos aspectos que a gente tem trabalhado.
Eu me recordo que, logo depois da implantação acho que da segunda eleição dos
Conselhos Tutelares, houve todo um movimento, com uma força-tarefa liderada por
esta Casa, que fazia investigações junto com o DECA, fazia batidas nas casas
que tinham prostituição infantil. Foi quando se formaram o DECA, a Delegacia da
Criança, o Conselho Tutelar, enfim, todos os órgãos ativos da sociedade. E uma
dessas casas ajuizou um mandado de segurança dizendo o seguinte: “Eu tenho
alvará, eu cumpro todos os requisitos da lei. Então, a minha atividade é
lícita, ela tem que se manter”. Na época, nós tivemos uma séria dificuldade de
sustentar toda aquela ação administrativa, porque os requisitos do alvará
realmente são lineares. O que respalda a atuação de tudo isso é... Na verdade,
hoje nós temos um universo maior de questões a ser protegido, dentre o qual
está o princípio da dignidade da pessoa humana.
O exemplo jurídico que aparece com maior ênfase vem
do Direito francês, que é o denominado Caso do Anão. Lá eles tinham uma
prática, que era arremesso de anões, e o Prefeito da cidade suspendeu dizendo
que isso era uma prática contrária à dignidade da pessoa humana. Há uma série
de discussões jurídicas: se o anão pode ou não ter isso como atividade, se ele
pode doar seu corpo. Eu não vou entrar nesse universo, não é o meu papel aqui.
Agora, transpondo essa discussão para a nossa realidade, nós temos uma série de
outras situações em que o fio condutor é a dignidade da pessoa humana, e,
muitas vezes, aquele exame concreto do alvará, da atividade em si, ele não está
de acordo com a finalidade prevista. E isso nos faz, hoje, robustecer as teses
para fortalecer essas ações que surgem em cumprimento, por exemplo, dessa
política pública. Aqui eu poderia falar de outras questões de
minorias, mas não vou me estender; o raciocínio serve para todas essas
finalidades.
Temos a questão da
sustentabilidade urbana ambiental como meta, que está sempre questionada. E
aqui o conceito de sustentabilidade é um conceito em aberto, que se prende com
uma série de conteúdos. Eu dizia para a Verª Sofia Cavedon, quando conversamos
aqui na semana passada, que eu, como brasileira, cidadã porto-alegrense, e a
minha vivência na Procuradoria sempre foi - hoje não - muito voltada para essa
área de urbanismo e meio ambiente, me preocupo muito com os efeitos, com as
questões decorrentes de o INPE ter colocado a nossa Região no País como área
sujeita a ciclones extratropicais, e é uma preocupação muito concreta, é com
relação à nossa polícia de edificações. Uma coisa é termos ciclones
extratropicais e todas essas movimentações excepcionalmente; termos marcos
significativos como, por exemplo, a grande enchente de Porto Alegre. Agora,
esses pontos todos estão sendo colocados pelos cientistas como fenômenos que vão
ocorrer não ciclicamente, mas de modo reiterado no meio em que estamos vivendo.
Será que a nossa polícia de edificações está preparada para isso? E o nosso
Código? Não será este o momento de pensarmos nessas matérias? A quantidade de
vidros que permitimos? Eu já tenho visto muitas cidades revisitando os seus
conceitos de edificação à luz desses conteúdos todos.
Além disso, no
momento em que estamos discutindo escassez da água, estamos discutindo a
necessidade de otimização energética, nós ainda seguimos permitindo aqueles
“prédios inteligentes” que, num dia como hoje, extremamente agradável, não se
pode abrir a janela, porque não têm janela. Os prédios públicos, em grande
parte, os novos, são assim, são prédios que utilizam luz o tempo todo. O mundo
está revisando os seus conceitos, vejam a ideia de ter proteção nas edificações
para evitar que seja aquela geladeira no inverno e aquele calor horrendo no
verão. Voltamos, inclusive, a alguns conceitos antigos, como manter um porão,
ou, como a Europa está fazendo, construir telhados verdes. Quer dizer, são
discussões sobre as quais nós precisamos nos debruçar nesta Cidade, se
quisermos tratar os elementos da sua sustentabilidade na sua integralidade. Como estão
os nossos canteiros de obras? Enfim, é uma série de questões que precisa ser
trabalhada.
Eu não vou estender-me e falar sobre a questão da
cidade democrática, porque os senhores sabem muito mais do que isto. A única
ponderação a ser feita é que esse, hoje, é um conceito jurídico, por isso os
entraves que ocorrem com relação à chegada dessas matérias no Judiciário.
Já me encaminhando para o encerramento: todo esse
raciocínio que é desenvolvido está calcado no conceito jurídico de cidade,
estabelecido pela nossa Constituição e colocado nestes artigos, que estão aí
sintetizados. Se são possíveis conclusões preliminares nesse sentido - e aí
tentando contribuir para essas reflexões que têm surgido aqui -, eu teria a
colocar aos senhores que estamos num momento de releitura de vários âmbitos do
Direito. Aconteceu com o Direito Civil, logo após a Constituição - releitura no
sentido de constitucionalizar todas aquelas práticas jurídicas -, com o Direito
Empresarial, e agora estamos fazendo isso com o próprio Direito Administrativo,
com o Direito Urbanístico, e o Direito Ambiental nasce enraizado na
Constituição. Nós estamos num momento em que discutimos como ter
sustentabilidade, por exemplo, das compras púbicas com os critérios de
licitação que nós temos; estamos num momento em que já temos orientações, por
exemplo, de a merenda escolar ser adquirida dos próprios produtores do
território, para absorver as compras e trabalhar essa ideia de
sustentabilidade.
Então, isso mexe com o direito que nós aprendemos,
com os princípios - e eu fico muito a vontade aqui, porque há um colega na
tribuna -, mexe com o direito que nós aprendemos, que trabalhamos, mexe com os
dogmas da nossa construção. E aí vai para o Direito Civil, para as matérias de
desapropriação, etc. Então, essa releitura é permanente, inclusive da ideia do
direito de construir. A jurisprudência tem auxiliado bastante nessa releitura,
porque os tribunais incorporam a noção de princípios, o que a Administração
Pública tem enorme dificuldade ainda de incorporar. A Administração Pública
ainda é linear; e os tribunais, paulatinamente, cada vez mais - é só acessarem
e vão ver -, estão anulando as licenças para construir por falta de observância
de Estudos de Vizinhança, por exemplo. Recentemente, o STJ deu uma decisão com
relação à proibição de retrocesso de áreas protegidas, que é o caso City Lapa,
no Rio de Janeiro. Nós temos decisões muito pontuais com relação à
preponderância dos Planos Diretores em determinadas matérias; prevalecendo os
princípios e, muitas vezes, afastando regras específicas, o que nos mantêm muito
atentos às inovações que nós temos aí.
Essa identificação, então, do direito à Cidade como
uma síntese de feixes de direitos faz com que nós tenhamos que nos preparar
para trabalhar esse conteúdo na sua essencialidade. O direito é um desses
elementos; nós temos feito, na Procuradoria, um esforço nesse sentido e, na
Escola de Direito Municipal, trazido pessoas de fora - professores, a
Especialização trabalha com esse conteúdo -, justamente porque, para bem
trabalhar esses conteúdos da Cidade e reforçar, inclusive, as coisas que os
senhores aqui aprovam, é necessária essa revisitação dos institutos, essa
colocação do direito nesse espaço público. Um dos nossos primeiros
aprendizados, por exemplo, de disputa de competência municipal nasceu nesta
Casa com a discussão das estações de radiobase de celular. Houve uma suspensão,
inclusive, dos atos, houve todo um esforço, e hoje o Supremo reconhece aquela
tese que iniciou aqui em Porto Alegre, entre outras - esta eu me recordo com
mais ênfase. Agora, todas essas matérias exigem essa aproximação para afirmação
dos direitos dessas cidades que nós tanto defendemos e diante do compromisso
que temos. Obrigada, desculpem-me por ter me estendido. (Palmas.)
(Não revisado pela oradora.)
A SRA.
PRESIDENTE (Sofia Cavedon): Nós a ouviríamos por mais uma hora aqui, porque,
com certeza, cada um dos conceitos, para nós e para a Cidade, tem grandes
implicações.
O Ver. Engenheiro Comassetto está com a palavra em
Comunicações.
O SR.
ENGENHEIRO COMASSETTO: Srª Presidente, Verª Sofia Cavedon; nossa ilustre
convidada, seja sempre bem-vinda aqui. Trabalhar o direito à cidade obviamente
é um renovar constante dos conceitos e de suas aplicações. Mais recentemente, o
tema “cidade” vem ganhando força, pelo menos na esfera política e na estrutura
republicana do Brasil. Com o advento da Constituição do Ministério das Cidades,
passou-se a elaborar uma política de desenvolvimento urbano, e hoje tenho o
prazer de participar como Conselheiro Nacional das Cidades no Fórum,
representando os Vereadores do Brasil. Neste momento, está-se desenvolvendo um
programa nacional de desenvolvimento urbano que pressupõe... (Pausa.)
(Aparte
antirregimental do Ver. Dr. Thiago Duarte.)
O SR. ENGENHEIRO COMASSETTO: Não, Ver.
Thiago, eu quero falar para a nossa palestrante. Só por isso.
Está-se desenvolvendo um programa de
desenvolvimento urbano que pressupõe a
integração das três esferas - Município, Estado e União. Isso, do meu ponto de
vista e da política que está sendo desenvolvida, não pode ser feito de uma
forma impositiva, mas sim em forma de conquista e de entendimento entre essas
três esferas, tanto que há a disputa, que é pequena, de verbas que precisamos
para poder reestruturar as cidades em todas as suas dimensões. Agora está
aprovado no Conselho Nacional - o próprio Ministro já determinou, e é uma
resolução - que aqueles Municípios que não se adequarem ou não se integrarem ao
sistema irão ficar fora da transferência de algumas verbas. Eu vou citar aqui
duas áreas, que são extremamente importantes, e este ano todos os Municípios do
Brasil devem concluir os seus planos municipais: habitação e interesse social,
bem como a de saneamento básico. Eu quero trabalhar um pouco com a senhora
nesses dois minutos que me restam.
A conquista da sociedade que nos dá liga nesse
avanço da conquista jurídica é o Estatuto da Cidade. E o Estatuto da Cidade tem
um conjunto de ferramentas. Nós podemos pegar o Direito de Perempção, a questão
do IPTU progressivo no tempo, a questão da implantação das Zonas Especiais de
Interesse Social, no nosso caso as AEIS, que surgiram antes do Estatuto da
Cidade, mas Porto Alegre resiste em implementar esses instrumentos. Nós não
temos o IPTU progressivo no tempo, e a Cidade se expande para onde há os vazios
urbanos, e ficam vazios urbanos nas áreas consolidadas. Nós precisamos
construir equipamentos públicos, e o Direito de Perempção é uma prerrogativa do
Poder Público, de gravar áreas em espaços nobres para os serviços sociais, como
habitação e educação. Ainda hoje, nós temos em Porto Alegre os vazios, sejam
eles de educação ou outros. Na semana passada nós debatíamos aqui, nas emendas
do Orçamento, emendas que propunham criar escolas de Ensino Fundamental onde
existe vazio de educação - foi um debate que se travou nesta Casa.
Também há um outro tema, que é a regularização
fundiária. Nós possuímos, em Porto Alegre, em torno de setecentas vilas
irregulares, muitas em processos de AEIS, mas com a indefinição de termos uma
política forte, uma política que busque a regularização fundiária como uma meta
de conquista à Cidade. Eu concluo dizendo que todos esses que estão em vilas
irregulares, que não têm os seus endereços, não estão incluídos na urbanidade
com os direitos à Cidade.
Do meu ponto de vista, se não debatermos alguns
temas e não implementarmos esses instrumentos do Estatuto da Cidade, as cidades
não estarão sendo cidades na sua plenitude. Muito obrigado, um grande abraço.
(Não revisado pelo orador.)
A SRA.
PRESIDENTE (Sofia Cavedon): O Ver. João Antonio Dib pede dois minutos. Eu pediria
licença ao conjunto dos inscritos, inclusive, porque ele está organizando uma
Reunião às 15h30min, uma demanda que chegou à Presidência.
O Ver. João Antonio Dib está com a palavra em
Comunicações.
O SR. JOÃO
ANTONIO DIB: Srª Presidente, Verª Sofia Cavedon; Sras Vereadoras, Srs.
Vereadores, minha cara Drª Vanêsca Buzelato Prestes, eu sou um indivíduo que se
coloca contrariamente ao “Direito à cidade, direito de todos - dimensão
constitucional do direito à cidade”. Na verdade, o direito começa do dever, e
nós só falamos em direito; quem é que tem dever para com a Cidade? Cada um dos
cidadãos que pretende ter direito tem dever: ele precisa cuidar das suas
árvores, da sinalização, não depositar lixo em lugar indevido, não estragar os
semáforos, os telefones. Isso é dever. Nós precisamos incutir na população o
dever que ela tem para com a sua cidade, e nós só ficamos falando em direitos.
A Constituição é magnífica quando fala em direitos: o salário mínimo é para
sustentar quatro pessoas; a Saúde é direito de todos. Mas eu não vejo acontecer
isso. Então, eu acho que é chegada a hora de começar a falar nos deveres,
porque nós temos muitos deveres com a nossa Cidade, nós precisamos resolver
muitos problemas com a Cidade. Eu já tinha reclamado na semana passada, quando
a nossa Presidente, na reunião de Mesa e Lideranças, falava sobre um documento
que será publicado pela Câmara com este título: “Direito à Cidade, Direito de
Todos”. Acho que temos que falar nos deveres de todos, porque, se não
cumprirmos o nosso dever com a nossa cidade, ninguém assegurará direitos para
todos os cidadãos. Saúde e PAZ!
(Não revisado pelo orador.)
A SRA.
PRESIDENTE (Sofia Cavedon): Quero fazer referência à presença do Presidente da
Câmara Municipal de Rio Grande: está aqui o Ver. Paulo Renato Mattos Gomes.
Seja bem-vindo à nossa Cidade, Capital de todos os gaúchos! (Palmas.) O
Vereador-Presidente é do PPS - pede o Ver. Toni Proença que divulguemos. Seja
muito bem-vindo!
(Manifestação fora do microfone do Ver. Engenheiro
Comassetto. Inaudível.)
A SRA.
PRESIDENTE (Sofia Cavedon): O Ver. Comassetto diz que Rio Grande é a cidade que
maior número de investimentos federais está recebendo. Será um novo polo de
desenvolvimento do Estado - estamos todos muito orgulhosos, é verdade -, atraindo
empresas dessa área da construção de navios, e há a potencialização do pré-sal.
Seja bem-vindo!
O Ver. Carlos Todeschini está com a palavra em
Comunicações.
O SR. CARLOS
TODESCHINI: Srª Presidente, Verª Sofia Cavedon; Sras Vereadoras, Srs.
Vereadores, nossa palestrante, Drª Vanêsca Buzelato Prestes, competente
Procuradora do nosso Município, e aqueles que nos assistem: se for verdade que
todos têm deveres, e o é, porque isso está garantido, é obrigado por lei, eu
quero me referir àquelas obrigações que têm as autoridades, por poder delegado,
e sua alçada e competência sobre as questões de Estado.
Nós,
recentemente, fizemos aqui na CEDECONDH, presidida pelo Ver. Dr. Thiago Duarte,
um belíssimo debate sobre a questão das catástrofes ambientais. Uma coisa que
ficou constada, e é chocante, por exemplo, é que tínhamos um grupo de trabalho
que cuidava das áreas de risco na Cidade, que funcionou ordinariamente,
coibindo e impedindo as habitações irregulares em áreas de riscos, e isso foi
solenemente desmontado nos últimos cinco anos. Não há mais nada! Há duas
pessoas que fazem trabalho voluntário para tentar conter o risco. É por isso
que todas as áreas de risco estão sofrendo uma ocupação violenta. Onde está a
autoridade nesse caso? Porque, se é verdade que todos têm obrigação de cumprir
as leis, mais as têm as autoridades que estão investidas em poderes para
coerção nesses momentos em que as necessidades de ordenamento do espaço público
se apresentam.
Sobre a questão da Saúde: hoje pela manhã nós
estivemos - eu e o Ver. Dr. Thiago - representando a Comissão de Saúde no
Hospital Conceição, junto com os administradores e com responsáveis pelos
hospitais e instituições de Saúde aqui na Cidade. E uma coisa que me chamou a
atenção na apresentação do Dr. Neio, que é o Superintendente do GHC, é que o
aumento da incidência dos casos de câncer é mais acentuado aqui na cidade de
Porto Alegre. Havia um médico ao meu lado, e eu lhe perguntei: “Por que isso
estaria acontecendo?” E ele me deu a seguinte explicação: o índice de longevidade
das pessoas está aumentando, portanto a incidência de câncer é maior; os maus
hábitos, o estresse, a rotina, a vida na Cidade são fatores ambientais difusos,
mas que atingem a todos; a questão dos hábitos alimentares, que pioram ao invés
de melhorar; e a última questão me chocou muito: possivelmente, a incidência de
ondas eletromagnéticas está afetando a todos, e aí, Vereadora, nós temos o
celular, temos as antenas, enfim, temos todo um conjunto novo - que pode até
não ser, mas também pode ser - de elementos invisíveis que afetam o meio
ambiente e a vida das pessoas. Então, são questões bem significativas, e eu
creio que devemos aprofundar esse importante debate trazido pela Mesa Diretora
da Câmara.
De outro lado, temos a questão dos espaços públicos,
os espaços de distribuição da Cidade. Tivemos um debate aqui em relação à orla,
ao Pontal do Estaleiro, um plebiscito em que, sabiamente, na minha opinião, a
população manifestou-se, mas esses espaços são constantemente pressionados para
serem diminuídos, alterados ou superocupados, tanto com habitação como com
atividades da Cidade. Enfim, há um conjunto de elementos que contaminam, que
influenciam perversamente a vida na Cidade e que precisam, sim, ser
aprofundados em debate.
Por último, também tenho a lamentar o desmonte que
foi feito nas equipes técnicas da Procuradoria, equipes que examinavam os
processos à luz da boa técnica, que foi substituída pela decisão e pela opção
política das escolhas. Obrigado pela atenção.
(Não revisado pelo orador.)
O SR.
PRESIDENTE (Toni Proença): O Ver. Elói Guimarães está com a palavra em
Comunicações.
O SR. ELÓI
GUIMARÃES: Presidente, Ver. Toni
Proença; Drª Vanêsca Buzelato Prestes, de quem tive a honra de ser colega e
também colega de concurso para a Procuradoria aqui do Município de Porto
Alegre, eu até a trataria como uma jus
polis, dada a sua dedicação ao urbanismo, ao trato e ao enfoque jurídico a
essa entidade que é a cidade. Tenho dito que não há espaço mais importante para
o ser humano, para o cidadão, que a cidade. A cidade é berço e é túmulo, no
sentido de sua dimensão social, econômica e jurídica; é onde o mundo se
desenvolve, porque Município é uma conceituação territorial, mas a cidade se
constrói e vai ampliando os seus espaços, e temos casos de cidades que têm
exatamente a dimensão do Município. Aliás, na velha Roma, a polis era a cidade-estado. Então, veja
que tema palpitante e importante que é trazido à Câmara, que tem papel
relevantíssimo na concepção, diríamos assim, até modelar da cidade! Então a
querida Drª Vanêsca traz um tema extremamente importante, com o conhecimento
que tem da matéria.
Nós nos preocupamos com esse espaço público, que
sofre os mais diferentes embates. Eu, por exemplo, defendo o direito de
propriedade - quero deixar claro -, mas há uma verdade: a propriedade, pela sua
arrogância, muitas vezes invade territórios e espaços sociais, o que não
poderia acontecer. A cidade, que é espaço de todos, de extrema sensibilidade, é
um complexo material e imaterial. Os valores imateriais que se integram no
cotidiano das pessoas são direitos das pessoas; é o direito subjetivo à cidade,
compatível com a dignidade humana. Todos são fatores extremamente importantes.
O Ver. João Dib trazia aqui a questão do dever. O
dever está ínsito na ideia do direito, é um componente do direito. Quando se
fala em direito, fala-se em sujeito, em direitos e deveres: não existe direito
sem dever, ele é ínsito na sua natureza, na sua formação. Portanto, o tema é
extremamente instigante, é extremamente importante.
Eu tenho, em algumas iniciativas, Drª Vanêsca,
tentado defender até a imagem da Cidade, que vai se construindo e estabelece a
sua imagem. Eu tenho um Projeto que torna imodificáveis determinadas áreas da
Cidade, exemplificativamente, os monumentos e espaços, porque a Cidade está
dentro da nossa cabeça, Ver. Pedro Ruas. Aonde formos, onde estivermos,
lembramos de Porto Alegre, vem a nós a sua imagem. Então, temos que preservar
essa conquista. Mas, realmente, a Cidade sofre as agressões de toda a ordem. Esta
Casa, que detém o poder de legislar sobre ela, tem um papel extremamente
importante. Muitas vezes não percebemos a importância que nós temos na
configuração da Cidade, que pertence ao povo, é direito do povo. Então, toda
vez que tocarmos nos aspectos estruturais, temos que ter absoluta cautela para
não a deformar, para preservá-la, para fazer com que a Cidade seja efetivamente
onde se vive, onde se cria a família, onde a sociedade se desenvolve, porque a
cidade, hoje, é exatamente isso, ela se constrói diferente do Município. O
Município é uma definição territorial, mas a cidade vai sendo construída e vai
avançando.
Então, encerro, Presidente; mais uma vez, quero
cumprimentar a Drª Vanêsca jus polis,
pois é especialista lá na Procuradoria, dedicada à área da cidade, às questões
ambientais e ligadas ao urbanismo. Meus cumprimentos pela sua palestra, venha
mais vezes à Casa, porque esse é um tema transcendental, é um grande tema,
chama a nossa atenção para a importância disso que se chama cidade, que é onde
nós vivemos e onde a vida se realiza. Obrigado.
(Não revisado pelo orador.)
O SR.
PRESIDENTE (Toni Proença): O Ver. Pedro Ruas está com a palavra em
Comunicações.
O SR. PEDRO
RUAS: Sr. Presidente, Ver. Toni Proença; minha cara Vanêsca Buzelato Prestes,
que há algum tempo não via, já trabalhamos juntos, tenho muita alegria ao
revê-la; Vereadoras, Vereadores, público que nos assiste, falo aqui em meu nome
e, com muita honra, em nome da Verª Fernanda Melchionna e em nome da Bancada do
PSOL. O que nos traz à tribuna a Drª Vanêsca é um outro olhar sobre o que nós
temos hoje; o título, a obra é “Direito à cidade, direito de todos - dimensão
constitucional do direito à cidade”. Eu acho que os enfoques anteriores foram
absolutamente adequados, corretos, assinaria embaixo de todos, haveria talvez
uma que outra retificação, mas eu não quero repeti-los, eu quero colocar de
outra maneira. Nós temos tido dificuldades, Drª Vanêsca, em alguns aspectos que podem comprometer aquilo que, em tese - e a
senhora coloca muito bem na obra e aqui na palestra -, é o direito à cidade. É
um direito à cidadania que inclui todas as faces do cidadão ou da cidadã no
pleno uso dos seus direitos, o que, para nós, depende muito de cobrança e
fiscalização.
Sem entrar em
detalhes, nós estamos ainda num debate aqui na Casa, por exemplo, sobre a CPI
da Saúde, e a senhora sabe que é um debate sobre milhões de reais, valores
desviados que nós queremos reaver, queremos identificar os culpados. Mas hoje
há uma hipertrofia do Poder Executivo em todas as esferas. Assim como aqui o
Executivo Municipal não permite uma investigação por meio de CPI, Verª Fernanda
Melchionna, ali, no Piratini, no Governo Estadual, também o Executivo Estadual
não permite a realização de CPI para investigar, Ver. Elói Guimarães, o caso
dos “pardais”. Então, essa hipertrofia do Poder Executivo em suas diversas
esferas nos deixa alarmados, porque atinge, de alguma maneira, o direito à
cidadania e, na sua visão correta, do nosso ponto de vista, o direito à Cidade,
porque ela não é plena para todos. A Cidade, Ver. Todeschini, é para alguns -
para alguns -, assim como a Justiça é para alguns, a Saúde é para alguns, a
escolaridade é para alguns. E nós temos uma situação em que quem poderia cobrar
- os mandatários do povo nos Legislativos - fica amordaçado por manobras dos
Executivos, vide Porto Alegre, vide Rio Grande do Sul; numa mesma linha
que, para todos nós, representa o retrocesso, uma mordaça, uma dificuldade em
afirmar na prática aquilo que é, sim, um direito à cidade: o transporte
coletivo, a saúde, a escola pública de qualidade, o meio ambiente.
Então, são questões,
Drª Vanêsca, que eu sei que a senhora conhece, V. Sª é mestre no tema, a
senhora nos traz essas questões e nos possibilita reflexões, desde as nossas
decepções - que não podem ser motivo para qualquer paralisação de atividades -,
até mesmo novas formas de ver o mesmo problema, a partir teorizações
brilhantes, como nos faz a senhora, Drª Vanêsca. Eu registro aqui o nosso
contentamento por este reencontro. Em nome da Verª Fernanda Melchionna e em meu
próprio nome, receba um incentivo ao seu trabalho, também um agradecimento,
porque é de trabalhos como este que podem surgir ações políticas melhores, de
compromissos mais elevados com a sociedade, que podem realmente fazer a
diferença na vida das pessoas e no efetivo direito à cidade para todos.
Obrigado.
(Não revisado pelo
orador.)
O SR. PRESIDENTE (Toni Proença): O Ver. Dr.
Thiago Duarte está com a palavra em Comunicações.
O SR. DR. THIAGO DUARTE: Ilustre
Presidente, Ver. Toni Proença; ilustre convidada, eu, antes de mais nada,
queria, neste Dia Internacional da Saúde, relembrar as batalhas diárias no que
se refere à Saúde e, principalmente, como foi dito aqui, ao acesso à Saúde.
Saúde sem acesso é não Saúde! Hoje eu queria transmitir uma congratulação muito
especial aos jornalistas e aos médicos legistas, porque a ausência de saúde
acaba nos médicos legistas. Então, é muito importante relembrá-los e saudá-los
neste dia.
O Sr. Dr. Raul: Vossa Excelência
permite um aparte? (Assentimento do orador.) Ver. Thiago, é muito importante a sua lembrança. Nós, médicos,
estamos sempre ligados, e, realmente, hoje quero mandar um abraço a todos os
colegas. Quero falar que Porto Alegre hoje sancionou a lei que dá direito aos
funcionários públicos municipais a utilizar o IPE, justamente no Dia Mundial da
Saúde. Ontem também sancionou a lei que cria a Fundação Pública de Direito
Privado, que vai ampliar a rede básica de saúde da Cidade, vai, praticamente,
dobrá-la. Isso quer dizer que estamos ajudando bastante nesse trabalho.
O SR. DR. THIAGO DUARTE: Obrigado, Ver. Dr.
Raul. Era exatamente isso que eu queria mencionar, Ver. Dr. Raul. A Prefeitura
cria a possibilidade de mais profissionais serem contratados pelo Município,
fugindo um pouco desta lei que amordaça, que é a Lei de Responsabilidade
Fiscal, que, para a Saúde, muitas vezes, prejudica o processo. Iniciando o
Instituto de Saúde da Família, tendo a possibilidade de os servidores do Município terem acesso ao IPE, certamente a gente amplia
esse acesso que eu estava mencionando aqui, certamente a gente poderá construir
uma Saúde muito melhor; tenho grande expectativa nesse sentido.
Como bem
falou aqui o Ver. Todeschini, discutimos, lá no Hospital Conceição, a questão
das Emergências e Urgências, que é um sintoma e tem tudo a ver com a Cidade. O
problema não são as Urgências e Emergências; o problema é o entorno desse
processo. Tem que se dar mais acesso ao Sistema de Saúde, para que as pessoas
possam se tratar precocemente próximo da sua residência; tem que se dar
resolubilidade aos profissionais de Saúde. E, mais uma vez, vou reiterar aquela
afirmação que a gente tem costumeiramente feito aqui: o problema, no que tange
à Saúde, não está nos profissionais de Saúde; o problema da Saúde começa ser
resolvido a partir do entendimento de que os profissionais são o principal
arcabouço para que isso possa se resolver.
A
Comissão de Saúde e Meio Ambiente, neste ano, tem se pautado por assuntos
fortemente vinculados à Cidade. Conversamos já sobre o transporte hidroviário,
tivemos a primeira viagem experimental ligando o Cais do Porto ao Lami,
mostrando a viabilidade desse transporte e, até parafraseando, dizendo que o
metrô pode e deve ligar a Zona Norte, e esse novo modal pode ligar o Centro à
Zona Sul da Cidade. Conversamos já sobre os desastres ambientais e áreas de
risco, trazendo aqui a experiência da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, muito rica nesse processo, que pode, concatenada com os outros atores,
realmente ser muito importante nesse novo processo, nesse novo mundo em que
estamos vivendo. Conversamos exaustivamente sobre
pichações numa Sessão - concluo minha fala -,
conversamos sobre monumentos, conversamos sobre as praças, e é importante que o
público que nos ouve e os demais Vereadores, dentro das suas possibilidades,
possam participar junto conosco, para que possamos construir alternativas para
esse processo. É fundamental que possamos devolver à comunidade as áreas de
convivência que nela existem. É fundamental que façamos isso! E, para que o
cidadão possa se apropriar novamente dos espaços públicos, é muito importante
que o Estado se faça presente, para que possamos mudar este paradigma.
Obrigado.
(Não revisado pelo
orador.)
O SR. PRESIDENTE (Toni Proença): O Ver. Airto
Ferronato está com a palavra para uma Comunicação de Líder.
O SR. AIRTO FERRONATO: Sr. Presidente, Srs.
Vereadores, Sras Vereadoras, nossa estimada amiga
Drª Vanêsca Prestes, tenho conhecimento do seu trabalho há bastante tempo e sou
sabedor da competência com que V. Sª trata as coisas da cidade, muito
especialmente da nossa querida Porto Alegre.
Eu solicitei este
tempo de Liderança, que vem num momento bastante interessante, em primeiro
lugar, pela presença e pela exposição da Drª Vanêsca; em segundo, porque me
precederam os nossos Vereadores médicos, o Dr. Thiago e Dr. Raul. Eu recebi, e
estão conosco no plenário, a Direção do nosso Saerme, um centro de atendimento
à saúde mental da criança, uma instituição que se dedica ao atendimento de
crianças especiais, autistas em sua maioria, sito na Rua Marcílio Dias, 825, no
bairro Menino Deus. A entidade foi fundada em 1969 - lá se vão diversas décadas
- e, desde 1971, atende em regime de hospital/dia crianças na faixa etária de
três a doze anos incompletos, em parceria com o Ministério da Saúde, através de
credencial com o Sistema Único de Saúde, o SUS.
No sábado e domingo
passados, tivemos, na nossa Cidade, diversos eventos que registraram o Dia
Mundial do Autista. E aqui estão presentes as mães dos meninos e das meninas
que são atendidos nesse hospital/dia. Numa correspondência enviada à Direção do
Saerme, ao Sr. Adimiro Sari, que está aqui presente, foi solicitado que, a
partir de 1º de março de 2011, o hospital passasse a encaminhar os pacientes
atendidos nessa instituição para o Santa Marta, e foi conseguido um prazo de
sessenta dias para essa transferência de atendimento. Acontece que algumas mães
já estiveram no Santa Marta, e o pessoal de lá sequer sabe do que se trata, meu
caro Presidente e ilustres Vereadores. Nem sabem do que se trata!
Existe um
abaixo-assinado com mais de mil e cem assinaturas de porto-alegrenses, que
pedem a retomada do processo no Saerme. Eu estou aqui pedindo que todos nós,
Vereadores, façamos um esforço para conseguir a reversão desse quadro, para que
essa instituição de Porto Alegre, que atende crianças com deficiências
especiais, retome... Ou melhor, pedimos que não seja concluída a negociação e
que essa instituição continue a funcionar. Eu disse para as mães presentes que
eu viria a esta tribuna. As mães estão aqui, e eu não acredito, meu caro Ver.
Marcello Chiodo, que as mães estariam aqui querendo a continuação desse
atendimento se o atendimento fosse ruim e se elas não estivessem satisfeitas
com esse atendimento. Por isso é uma tarefa de todos nós, meu caro Presidente.
Vamos nos incluir nessa empreitada e vamos ver de que maneira conquistamos a
continuação desse serviço aqui na Cidade. Um abraço a todos. Obrigado.
(Não revisado pelo orador.)
O SR.
PRESIDENTE (Toni Proença): Ver. Ferronato, recomendo que o senhor encaminhe
esse assunto à Comissão de Saúde e Meio Ambiente, para que a gente possa chamar
aqui as autoridades responsáveis nesse processo.
O Ver. Dr. Raul Torelly está com a palavra em
Comunicações.
O SR. DR. RAUL
TORELLY: Ver. Toni Proença, na presidência dos trabalhos; saúdo a nossa
visitante, a Drª Vanêsca, que fez uma excelente apresentação aqui, como é de
seu hábito. Também vou me referir inicialmente à questão do Saerme, não dizendo
que estou me incluindo nesse processo, porque, na realidade, eu já estou
incluído há mais de três anos. Eu tenho acompanhado a questão do Saerme e tenho
procurado levar essa luta em frente, na condição de Vereador, junto com outros
colegas; inclusive, justiça se faça, o então Ver. Claudio Sebenelo foi quem me
apresentou o Dr. Adimiro, aqui presente. E a gente tem participado de outras
reuniões; com o Ver. Mauro Zacher, do PDT, estivemos com o Secretário da Saúde,
enfim, e o Ver. Dr. Thiago, Presidente da Comissão de Saúde e Meio Ambiente
desta da Casa.
O Sr. Dr.
Thiago Duarte: Vossa Excelência permite um aparte? (Assentimento do orador.) Obrigado,
Ver. Dr. Raul, pelo aparte. Nesta mesma sintonia de V. Exª, quero dizer que a
Comissão da Saúde e Meio Ambiente está aberta e disposta a fazer alguma reunião
ordinária ou extraordinária para mediar essa situação tão importante para essas
crianças. Obrigado.
O SR. DR. RAUL
TORELLY: Eu é que agradeço, Dr. Thiago. Quero dizer que também já tive a
oportunidade de visitar a instituição e ver o belo trabalho que é feito lá, o
tipo de atendimento, e as crianças que lá são atendidas, as quais têm,
realmente, muita dificuldade. Então, com certeza, nós vamos reforçar esse
exército que está começando a se formar, para que possamos tentar, de uma maneira
mais ampla, resolver eficazmente a situação do Saerme. Sabemos que é uma
situação difícil, conhecemos todo o processo, sabemos das formas com que vem
sendo levado, mas acredito que juridicamente é possível resolver, e a Câmara
não vai se furtar de estar presente na discussão para tentar reverter essa
situação do Saerme, que sofre, na realidade, o risco de finalizar o seu
atendimento com a quebra desse convênio. Nós precisamos manter os bons
parceiros do Município, e o Saerme tem se mostrado, há quarenta anos - o Dr.
Adimiro me sinaliza -, uma excelente parceira no atendimento a essas crianças.
Em relação à questão das cidades, eu queria,
também, deixar uma mensagem. Ontem, por exemplo, conversando com o Secretário
Busatto, referíamos ao Congresso da Cidade e à necessidade da interação com a
Internet, de que o cidadão e a cidadã acessem o site Porto Alegre CC, aonde vai se fazer essa integração, que já
está sendo feita. Há duas semanas é feita, cada cidadão pode criar uma causa
específica e, dentro das redes sociais, interagir com toda a cidadania, fazendo
com que adeptos de suas causas venham a influenciar as causas maiores da
Cidade, tornando-se, na realidade, porta-vozes de assuntos, de demandas e - por
que não? - de decisões importantes que passem a ser executadas pelo nosso Poder
Executivo, que, na realidade, nada mais deve fazer do que levar a cidade em
frente, levar o que o cidadão e a cidadão querem de melhor para sua cidade.
Muitas vezes, não conseguimos identificar com clareza total os assuntos, mas nós
temos exemplos muito importantes que estão nos dando uma aula de cidadania. No
caso do infeliz incidente que houve com os ciclistas, o movimento Massa Crítica
esteve, com duas mil pessoas de bicicleta, em frente à Prefeitura - não é uma
coisa governamental, partidária -, simplesmente ali estavam pessoas indignadas,
pessoas que querem andar de bicicleta, que é o mais justo e é o melhor para uma
Cidade. Se quisermos utilizar, por exemplo, outros modais que não seja o
trânsito pesado que nós temos, o uso da bicicleta é fundamental. Estou
apresentando isso como uma causa importante a ser tocada e defendida na nossa
Porto Alegre.
Eu gostaria de desejar saúde para todos e muito
especialmente ao Saerme; vamos continuar nessa luta, vamos ver se conseguimos
chegar lá. O nosso esforço não faltou até hoje e, com certeza, não será desta
vez que vai faltar. Saúde para todos. Obrigado
(Não revisado pelo orador.)
O SR.
PRESIDENTE (Toni Proença): A Srª Vanêsca Buzelato Prestes está com a palavra para as considerações finais.
A SRA. VANÊSCA
BUZELATO PRESTES: Queria dizer aos Srs. Vereadores que,
evidentemente, todas as colocações trazidas dialogam com o conteúdo que foi
aqui colocado. Então, eu tenho que fazer uma seleção dos comentários aqui, do
diálogo, porque eles foram extremamente profundos, eles envolvem uma série de
questões. Da fala dos senhores, eu pincei alguns pontos que me pareceram mais
importantes para dialogar sobre a dimensão jurídica aqui colocada.
Ao Ver. Comassetto, que tem uma trajetória
brilhante nessa área, a qual eu já conheço há muito tempo, quero dizer que, de
fato, a gente está num estado cooperativo que não cabe a simples determinação,
mas esse estado cooperativo tem mecanismos de retroalimentação. Na hipótese das
transferências de recursos que não são os obrigatórios, os constitucionalmente
previstos, tem sido uma prática interessante, em alguns Estados, a suspensão ou
o incentivo desses recursos para adoção de políticas públicas. Por exemplo, o
ICMS ecológico tem proporcionado boas experiências no Estado de Minas Gerais,
no Estado de Paraná, que deixam de passar uma parte do ICMS que não é a
transferência compulsória para os Municípios; eles adotam esse modelo.
Parece-me que é uma fórmula inteligente de fazer com que haja o envolvimento
juridicamente adequado.
Agora, a
contrario sensu a muitas práticas. A ideia de Federação pressupõe autonomia
de competências e autonomia entre os entes federados. Em muitos momentos, nós
tivemos que afirmar a nossa autonomia como Municípios. Eu recordo muito bem, há
tempos, em que nós tivemos que ajuizar ação contra a
União; a Procuradoria ajuizou ação contra a União, porque queriam cobrar o IOF
dos Municípios, quando temos imunidade. Aconteceu, de novo, no momento da CPMF.
Então, são vários momentos em que a gente tem que afirmar competência, mas
separando. Em tempos recentes tivemos o problema do Cadin, quer dizer, estar no
Cadin não implica... As transferências constitucionalmente estabelecidas já são
recursos que, por natureza, são dos Municípios, e não cabe a retenção.
Diferente das transferências voluntárias.
Ainda, de fato, o
Estatuto da Cidade é um conjunto de ferramentas, e falta muita aplicação nos
Municípios brasileiros e no nosso também. Não só de vazios urbanos, mas na
utilização de prédios. Nós temos a utilização compulsória e ainda não fizemos a
identificação. Quando os senhores aprovaram a lei municipal que dispõe sobre o
Programa Minha Casa, Minha Vida, nessa lei já havia determinação de que fosse
feito o estudo das áreas e dos imóveis vazios para que eles fossem
identificados e inseridos dentro das possibilidades do Programa Minha Casa,
Minha Vida. Na época, eu participava do Grupo de Trabalho do Município. É uma
questão que acaba passando ao largo e que me parece extremamente relevante.
A regularização
fundiária é um dos temas muito caros para a Procuradoria-Geral do Município. Em
1996, esta Casa aprovou a competência da Procuradoria para o ajuizamento das
ações de usucapião. Desde lá, nós vimos trabalhando nesse tipo de ação, depois
aplicamos mora ilegal e agora estamos discutindo a demarcação urbanística, que
foi introduzida como instrumento jurídico para agilizar os processos de
regularização fundiária na lei do Programa Minha Casa, Minha Vida. Todavia, há
uma série de dificuldades de aplicação no âmbito interno, é um daqueles
programas horizontais. Agora, isso nos deixa claro que eles têm que ser
tratados pelas carreiras permanentes da Administração Pública, pelas carreiras
de Estado permanentes da Administração Pública, que não saem a cada gestão, as
pessoas permanecem. Por quê? Porque são processos muito longos, que não
terminam em uma gestão, que demoram. Há processos lá que - faz parte do
procedimento - demoram dez, quinze anos. Então, não podem estar sujeitos, como
em outras áreas, à troca de Governo e à troca da prioridade, como é possível em
outras áreas. Essa área, parece-nos, é aquela que tem de
estar afeita às carreiras de Estado, justamente para que os senhores, a
população possam cobrar, na continuidade, essas matérias.
O Ver. Dib traz uma
matéria que é inerente à noção de direitos fundamentais. Claro que numa fala
rápida a gente não tem condições de colocar tudo, mas pari passu, como bem colocou o Ver. Elói, no direito há dimensão de
dever: dever de informação, dever de solidariedade. E isso precisa ser,
realmente, resgatado, porque estamos naquela geração de direitos que não é eu
contra o Estado - como estava naquela lâmina -, mas nós em favor do planeta, o
que implica em os particulares também se engajarem nesse conteúdo. E nós, na Procuradoria,
depois, temos de fazer a cobrança, por exemplo, das calçadas, da retirada de
painéis, essas questões que impedem a acessibilidade e por aí vai.
O Ver. Todeschini
resgata a importância dos espaços públicos como de distribuição da cidade, como
inerentes ao direito à cidade. Esse é um dos pontos extremamente importantes.
Quais espaços públicos? Como se constrói essa cidade? No planejamento - e o
Plano Diretor é um dos instrumentos para isto - nós temos como definir esse
zoneamento de áreas. O que faremos com os nossos espaços públicos? É possível
fechar? É possível regrar? Os condomínios não têm que destinar área pública?
Como fica essa relação? Nós estamos num momento em que os arrabaldes da Cidade
estão sofrendo um processo intenso de urbanização na contramão do que muito se
tem discutido no mundo, o que implica em mais trânsito, em mais circulação.
Para onde nós vamos? É uma pergunta que agrega essa reflexão que foi aqui
feita.
Com relação às áreas
de riscos: o mapeamento das áreas de risco, parece-me, não é só o que temos até
então. Precisam ser regatados os estudos do que existe, mas também temos que
fazer uma prospecção, porque os fenômenos climáticos estão nos dando conta de
que fenômenos que nós não conhecíamos hoje estão ocorrendo.
O Ver. Elói, colega
Procurador, na sua fala, diz que a cidade é o único ente da Federação que não é
uma ficção jurídica, por isso é um espaço de democracia, é um espaço de
convivência, em que precisamos resgatar esses elos-cidadãos que estão dentro do
conceito democrático. E outro ponto da sua fala que me parece extremamente
importante e que é pouco desenvolvido na nossa Cidade diz respeito ao
patrimônio imaterial, que a Constituição, no seu art. 216, também traduz.
Quando a gente fala de proteção ao patrimônio, o que vem na imagem usual é a
proteção do patrimônio material stricto
sensu, o bem tombado, a casa, o edifício; só que a nossa Constituição
trouxe uma série de outros elementos, que é o conceito de patrimônio imaterial,
que é a cultura local, que são as ambiências urbanas, que são os espaços
protegidos. Nós temos o exemplo das paneleiras do Espírito Santo: houve o
zoneamento da área de onde elas colhem o barro para fazer as panelas que nós
trazemos quando lá visitamos, há exemplo que vem de Salvador, com relação à sua
atividade cultural, mas nós aqui ainda temos um pouco de dificuldade de aplicar
esses instrumentos. Começamos nas Áreas de Interesse Cultural, tivemos,
juridicamente, muitas vitórias, mas pouca compreensão. Precisamos aprofundar.
Direito à paisagem é hoje uma questão que está muito apropriada no Brasil, e o
STJ tem reconhecido uma discussão importantíssima exatamente para essa ideia
intergeracional que está colocada na
Cidade.
O Ver. Pedro Ruas, em
toda sua fala, traz elementos integradores do direito à Cidade, elementos que
integram esse conteúdo de direito à Cidade. E, sem entrar no mérito das
questões colocadas, eu gostaria de destacar que a estruturação do serviço
público com carreiras permanentes é fundamental para que essas matérias perpetuem,
permaneçam, independentemente daqueles que estão na gestão em determinados
momentos. Nós temos tarefas permanentes da Administração Pública, e essas
inerentes ao direito à Cidade são as que essencialmente representam esse
conteúdo.
O Ver. Thiago trabalha
bastante o conteúdo de devolver as áreas de convivência à Cidade. Isso não é
uma realidade só de Porto Alegre, todos os estudos sociológicos dão conta de
que a gente foi se afastando da ideia de ágora, da praça, por segurança, pela
questão do individualismo, mas hoje a pós-modernidade, com a necessidade de
quebra de fragmentação, faz com que nós tenhamos que recuperar esses espaços de
convivência. Então, é uma lição que tem sido aprendida por muitos, e Porto
Alegre ainda traduz, em muitos desses passos, a pluralidade. Acho que cabe
manter, aprofundar, ampliar e resgatar muito esses elementos trazidos tanto
pelo Ver. Dr. Thiago como pelos Vereadores Dr. Raul e Airto Ferronato.
Sem me estender, eu
queria agradecer bastante pela oportunidade, que não é para a Procuradora
Vanêsca, mas para a Escola de Direito Municipal, que tem em seu conteúdo... Nós
estamos completando, neste ano de 2011, quinze anos de atuação, cuja trajetória
demonstra a afirmação deste direito todo aqui. Nós começamos a ser desafiados pelos
Srs. Vereadores já naquela época de implantação, de afirmação da Lei Orgânica,
quando tivemos que nos debruçar sobre tudo isso. Eu vi os senhores aqui
discutindo a questão da Saúde, eu lembro muito bem quando tivemos que criar uma
equipe de saúde na Procuradoria, porque não dávamos mais conta das demandas.
Tivemos que reaprender uma série de conteúdos pautados por esta Casa, para
sustentar, inclusive, o que esta Casa vinha aprendendo. Tivemos que incorporar
à nossa dimensão vários dos aprendizados dos conteúdos aqui colocados, e a
Escola vem cumprindo esse papel. Nós temos Especialização em Direito Municipal,
foi a primeira do Brasil aprovada. A nossa primeira edição foi feita em
parceria com a Universidade Ritter dos Reis, a segunda e a terceira com a UFRGS,
e agora já temos um curso que foi autorizado para funcionar com um programa
diretamente vinculado. E ele se presta, exatamente, para aprofundar esses
conteúdos que estão aqui colocados e traduzidos pelas políticas públicas no
âmbito da municipalidade, para sustentação e aplicação dessas políticas
públicas. Então, por tudo que eu ouvi dos senhores aqui, pelos desafios
propostos, eu agradeço imensamente em nome da Escola de Direito Municipal, que
tem na sua trajetória esse compromisso com a aplicação das políticas públicas
municipais. Muito obrigada. Estamos sempre à disposição desta Casa, para o que
necessitar.
(Não revisado pela oradora.)
O SR. PRESIDENTE (Toni Proença): Queremos, em
nome da Câmara Municipal de Porto Alegre, agradecer muito à Drª Vanêsca
Buzelato Prestes, que nos iluminou e nos ajudou a refletir sobre o tema
“Direito à cidade, direito de todos”, que traz aqui, como ela mesma afirmou, a
manifestação da Escola de Direito Municipal, mas aproveitando o talento e o
conteúdo que a Procuradora Vanêsca acumulou no estudo dessa
matéria. Quero agradecer também à Débora, da Escola Legislativa. Estão
suspensos os trabalhos para as despedidas.
(Suspendem-se os
trabalhos às 16h08min.)
O SR. PRESIDENTE (Toni Proença – às 16h09min): Estão reabertos os trabalhos.
Em votação
Requerimento de autoria desta Presidência, que solicita a inversão da ordem dos
trabalhos, para que possamos imediatamente entrar no período de Pauta; após,
retornamos à ordem normal. Em votação. (Pausa.) Os Srs. Vereadores que o
aprovam permaneçam sentados. (Pausa.) APROVADO.
Passamos à
PAUTA - DISCUSSÃO PRELIMINAR
(05
oradores/05 minutos/com aparte)
1ª SESSÃO
PROC.
Nº 0843/11 – PROJETO DE LEI DO LEGISLATIVO Nº 022/11, de autoria do
Ver. Nelcir Tessaro, que assegura o direito à concessão de uso especial para
fins de moradia de forma gratuita aos ocupantes da área conhecida como Vila
Dique removidos em decorrência de interesse público.
PROC.
Nº 1188/11 – PROJETO DE LEI DO LEGISLATIVO Nº 033/11, de autoria do Ver. João Carlos Nedel, que
denomina Rua Porto Feliz o logradouro público cadastrado conhecido como Rua
1052 – Loteamento Voluntários da Pátria –, localizado no Bairro Marcílio Dias.
2ª SESSÃO
PROC.
Nº 0764/11 – PROJETO DE LEI DO LEGISLATIVO Nº 018/11, de autoria do
Ver. Aldacir José Oliboni, que estabelece medidas preventivas e orientadoras
destinadas a inibir qualquer forma de violência contra professores da Rede
Municipal de Ensino.
PROC.
Nº 1045/11 – PROJETO DE LEI DO LEGISLATIVO Nº 028/11, de autoria do
Ver. João Carlos Nedel, que denomina Rua Antônio Barata o logradouro público
cadastrado conhecido como Beco Otaviano Pinto.
PROC.
Nº 1081/11 – PROJETO DE LEI DO LEGISLATIVO Nº 030/11, de autoria do
Ver. João Carlos Nedel, que denomina Rua Mauro Guedes de Oliveira o logradouro
público cadastrado conhecido como Rua Mil Quinhentos e Um, localizado no Bairro
Jardim Lindoia.
O SR. PRESIDENTE (Toni Proença): O Ver. João Antonio Dib está com a palavra para uma Comunicação de Líder.
O SR. JOÃO ANTONIO
DIB: Sr. Presidente, Ver.
Toni Proença; Srs. Vereadores, meus senhores e minhas senhoras, a data de
amanhã é uma data muito significativa para mim e significativa para a Cidade
também.
No dia 8 de abril de 1975, o jovem economista Guilherme Socias Vilella
assumia a Prefeitura de Porto Alegre, substituindo outro extraordinário
Prefeito, Telmo Thompson Flores, que deixava a Prefeitura depois de seis anos,
três meses e uma semana, engrandecendo esta Cidade. Vilella, ao longo de oito
anos, trabalhou incessantemente e construiu maravilhas nesta Cidade: fez os
corredores de ônibus, abriu a 1ª e a 3ª Perimetral, ampliou a capacidade de
tratamento das nossas hidráulicas, construiu parques, construiu radiais, como a
Av. Érico Veríssimo e a Av. Aureliano de Figueiredo Pinto, e a Rua Vasco da
Gama, construiu imensas obras. Ficou exatamente oito anos. E, no dia 8 de abril
de 1983, uma sexta-feira, como amanhã, este Vereador assumia a Prefeitura de
Porto Alegre, onde - o Ver. Brasinha gosta de dizer - permaneceu durante 999
dias.
Quero dizer que Porto Alegre teve três
extraordinários Prefeitos. O número um é, sem dúvida nenhuma, José Loureiro da
Silva; depois, vêm Thompson Flores e Guilherme Socias Villela. Os três têm uma
identidade, ou mais de uma até: os três gostavam de obras e realizaram grandes
obras nesta Cidade, mas os três eram ambientalistas. Loureiro da Silva foi
ambientalista; quando ninguém nesta Cidade, neste Estado, neste País falava em
meio ambiente, ele comprou os 1.300 hectares do Parque Saint-Hilaire; ele
impediu que a universidade avançasse sobre o Parque Farroupilha e levou-a a
instalar, como ela fez depois, o seu campus
lá na Agronomia - assim indicava Loureiro da Silva -; comprou a área onde hoje
está o Jardim Botânico e disse que o Hipódromo deveria ser transformado no Parcão,
e ele é hoje o Parcão. Thompson Flores fez a Reserva do Lami; Villela aumentou
a Reserva do Lami. Thompson Flores ainda criou o Centro Agrícola
Administrativo, mas Villela fez o Parque Marinha do Brasil, o Parque da
Harmonia, hoje Parque Mauricio Sirotsky Sobrinho; fez o Parque 20 de Maio, o
Parque Mascarenhas de Moraes, fez praças nesta Cidade, plantou árvores.
Agora, depois de 1999, eu não posso dizer a mesma
coisa, não posso dizer que os Prefeitos foram ambientalistas, durante os 16
anos: extinguiram a área rural, terminaram com 22 árvores que estavam ali na
Rua Vasco da Gama para vender um terreno da Prefeitura, sem compensação;
deixaram cortar 150 árvores da Rua da Correa Lima, sem compensação; permitiram,
por Decreto do Prefeito, o corte de figueiras, o que era proibido - sem
compensação. Então, eu fico com os três Prefeitos que foram realmente
ambientalistas, muito antes de muita gente que hoje grita pelo meio ambiente.
Portanto, eu quero saudar o Prefeito Guilherme
Socias Villela, porque amanhã estaria comemorando 36 anos que ele assumiu a
Prefeitura. Hoje nós fizemos um almoço, em que os meus ex-Secretários e os dele
- alguns foram de nós dois - comemoramos essa data; casualmente, numa
sexta-feira, Villela deixou a Prefeitura e este Vereador a assumiu. Posso dizer
que os três Prefeitos que eu citei marcaram profundamente a história da nossa
Cidade. Precisamos de pessoas iguais a eles, que realizem e que cuidem do meio
ambiente, plantando árvores como eles fizeram. Saúde e PAZ!
(Não revisado pelo orador.)
O SR.
PRESIDENTE (Toni Proença): O Ver. Carlos Todeschini está com a palavra para
uma Comunicação de Líder, pela oposição.
O SR. CARLOS
TODESCHINI: Sr. Presidente, Ver. Toni Proença; Sras Vereadoras e Srs.
Vereadores, eu não poderia deixar de vir aqui fazer um registro lamentando o
acontecimento de hoje no Rio de Janeiro, porque é abominável. E é bom lembrar
que aqui nesta Casa, assim como em outras Casas do País, houve um plebiscito
sobre a questão do desarmamento. E eu lembro muito bem das vozes que vinham
aqui e acusavam, e esbravejavam, diziam que aqueles que eram a favor do
desarmamento queriam armar os bandidos e desarmar o povo. Pois bem, aí está o
resultado do não desarmamento. Essa é uma situação típica resultante de uma
mente doentia, mas também porque possibilitarmos que armas fiquem disponíveis
nas mãos de gente que não pode e não deve ter direito ao acesso às armas.
Nós sabemos que a maior parte das armas entram por
contrabando, ou são roubadas e vendidas, inclusive por agentes das Forças
Armadas, o que é muito, muito lamentável, Ver. João
Antonio Dib. Agora, nós temos que nos deparar com esse episódio; inclusive,
está havendo uma superexploração midiática, mas é um fenômeno a lamentar:
assassinato de nove meninas e um menino, mais dezoito feridos em estado grave
ou gravíssimo. E isso tem responsabilidade: a escolha que se fez, quando se fez
uma discussão de caráter neofascista neste Brasil, querendo imputar
responsabilidade, valores, ideias, afirmando que aqueles que defendiam o desarmamento
queriam armar os bandidos, defendiam os bandidos, é a isso que leva.
Eu quero dizer que
tive uma posição muito clara e fui derrotado. O João Hélbio, que estava aqui
pelo Conselho de Segurança, recomendava... E teve parceiros, sim: a Igreja, as
Pastorais e muitos militantes. Nós tivemos apenas 17% de opinião favorável à
nossa ideia, algo muito lamentável. Lamentei muito essa posição. Inclusive,
logo após esse episódio, estive num evento nas Filipinas e lá encontrei um
professor universitário muito jovem ainda, de Amsterdã - a origem dele era de
El Salvador -, ele dizia: “A esperança que nós tínhamos também para acabar com
a violência em El Salvador era de que o Brasil, como um país importante,
tivesse uma lei que pudesse promover o desarmamento no País”. Não; ao
contrário, o País reforçou essa ideia do armamento, que é um pressuposto para a
violência. E lá ele me dizia: “Lá em El Salvador é permitido que as pessoas
tenham duas armas, inclusive um fuzil capaz de matar um elefante”. Dimensionava
a capacidade e a potência dessas armas.
Agora, nós temos que
nos deparar com isto, Ver. João Dib, e é uma das coisas mais lamentáveis que
nós temos, só acontece em função de haver armas disponíveis na mão de pessoas
que não têm condições nem emocionais, nem psicológicas, nem de outra natureza
para ter isso na mão - instrumentos da morte.
Inclusive, para nós,
que estamos assistindo pela SBT à novela das 22h, é bom que se recapitule tudo
o que aconteceu de violência, de usurpação de direitos, de assassinatos, tudo
aquilo que o País quer ver passado a limpo. É de arrepiar, não é, Doutora? É de
arrepiar! Confesso que derramei lágrimas também, coloquei-me no lugar daqueles que estavam
fugindo, que estavam sendo torturados, daqueles que usurparam essas liberdades.
Portanto, são episódios de mesma natureza, que têm, na violência, na violação
dos direitos, no autoritarismo, o pressuposto da ação. Esperamos que isso sirva
para que o Brasil reabra o diálogo do desarmamento, porque não vamos diminuir a
violência se isso não acontecer. Hoje pela manhã debatíamos lá no Hospital
Conceição, e conclui-se que a maior causa de mortes que temos é por projétil,
bala perdida ou bala acertada em alguém, é a violência disseminada na
sociedade. Muito obrigado.
(Não revisado pelo orador.)
O
SR. HAROLDO DE SOUZA (Requerimento): Sr. Presidente, solicito verificação de quórum.
O
SR. PRESIDENTE (Toni Proença): Solicito abertura do
painel eletrônico para verificação de quórum, solicitada pelo Ver. Haroldo de
Souza. (Pausa.) (Após apuração nominal.) Há oito Vereadores presentes. Não há
quórum.
Estão encerrados os trabalhos da
presente Sessão.
(Encerra-se a Sessão às 16h23min.)
* * * * *